Declarações feitas pelo arguido em processo penal

No passado dia 09.06.2023, foi publicado no Diário da República uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça, em que se considerou que “as declarações feitas pelo arguido no processo perante autoridade judiciária com respeito pelo disposto nos artigos 141.º, n.º 4, alínea b), e 357.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal, podem ser valoradas como prova desde que reproduzidas ou lidas em audiência de julgamento.” O que significa isto e quais as suas implicações?

Quando o Ministério Público dá início a um processo penal e tem suspeita fundada de quem seja o autor da prática de determinado crime, constitui essa pessoa como arguida. A constituição de alguém como arguido permite-lhe ter direitos no processo que o mero suspeito não tem, como por exemplo, a possibilidade de não prestar declarações sem que isso seja valorado contra si. É a chamada prerrogativa da não autoincriminação, isto é, ninguém pode ser obrigado a falar sobre factos que o incriminem, ou, por outras palavras, o facto de o arguido se remeter ao silêncio não o pode prejudicar no processo.

Durante a fase inicial do processo – a chamada fase de inquérito –, o Ministério Público interroga o arguido sobre os factos que aí estejam em causa e este pode ou não falar. Se optar por prestar declarações, desde que tenham sido feitas perante o Ministério Público (na pessoa de um procurador) ou perante o juiz, e verificados determinados requisitos, essas declarações podem ser utilizadas como prova para a decisão final do processo, mesmo que o arguido opte por não prestar declarações na audiência de julgamento.

E que requisitos são esses? Estas autoridades (procurador ou juiz) têm, no momento do interrogatório inicial, de ter informado o arguido dos seus direitos; do facto de que tudo o que disser naquele momento pode ser utilizado em fase posterior, designadamente na audiência de julgamento; dos motivos da detenção, se esta tiver ocorrido; dos factos que lhe são imputados; e das provas que existem, ressalvados os casos de proteção da investigação ou de vítimas ou outros participantes processuais, como testemunhas. Para além disso, o arguido deve estar acompanhado de defensor/advogado.

Por fim, estas declarações feitas no início do processo só podem ser utilizadas como prova, para além dos requisitos já enunciados, se forem lidas ou reproduzidas na audiência de julgamento.

Esta decisão do Supremo Tribunal de Justiça é um acórdão de fixação de jurisprudência, o que significa que os tribunais terão de seguir esta orientação nas decisões que tomarem daqui em diante.